segunda-feira, 22 de março de 2010

CARTA À INFÂNCIA - Neste país, só o Nuno Markl me compreende



Neste país, só o Nuno Markl me compreende.
Eu que já não podia falar do Tom Sawyer com ninguém. Eu que sou obrigado a almoçar aos fins de semana sem a companhia dos meus amigos do Verão Azul.
Não sabes a tormenta que é passear no jardim perto da minha casa, onde os cães só têm nomes de pessoas. Agora Nuno, que falaste do Dartacão, herói canídeo que nunca consegui apagar da memória, obrigado. Quando vim para aqui morar, senti que estava a enlouquecer, até o cão do vizinho tinha o nome com que os meus pais me baptizaram.




Neste país, só o Nuno Markl me compreende.
Como era bom saltar os muros para "roubar" fruta em quintal alheio.
Jogar ao Bate-pé para aprender os primeiros beijos.
Nuno, lembras-te a loucura de descer uma rua íngreme sentado num carro de esferas. Nós a segurar um cordel, como se fossemos montados num cavalo e a ventania no rosto a aumentar à velocidade do quadrúpede.
Era um tempo de magia, sim, porque as feridas que as brincadeiras ofereciam ao corpo não doíam.
A infância tinha pressa de descobrir coisas novas.

Nuno é tão bom ser um trintão com uma infância que ainda vive.

P.S - Um abraço de quem gostava de mergulhar nas águas lodosas de uma doca, nas tardes em que o Verão não deixava pensar que existiam doenças.

Alberto Pereira



ARTIGO DE NUNO MARKL P/ OS TRINTÕES



A juventude de hoje, na faixa que vai até aos 20 anos, está perdida.
E está perdida porque não conhece os grandes valores que orientaram os que hoje rondam os trinta.
O grande choque, entre outros nessa conversa, foi quando lhe falei no Tom Sawyer.
'Quem?', perguntou ele. Quem?! Ele não sabe quem é o Tom Sawyer! Meu Deus... Como é que ele consegue viver com ele mesmo?
A própria música: 'Tu que andas sempre descalço, Tom Sawyer, junto ao rio a passear, Tom Sawyer, mil amigos deixarás, aqui e além...' era para ele como o hino senegalês cantado em mandarim.
Claro que depois dessa surpresa, ocorreu-me que provavelmente ele não conhece outros ícones da juventude de outrora.
O D'Artacão, esse herói canídeo, que estava apaixonado por uma caniche; Sebastien et le Soleil, combatendo os terríveis Olmecs; Galáctica, que acalentava os sonhos dos jovens, com as suas naves triangulares; O Automan, com o seu Lamborghini que dava curvas a noventa graus; O mítico Homem da Atlântida, com o Patrick Duffy e as suas membranas no meio dos dedos; A Super Mulher, heroína que nos prendia à televisão só para a ver mudar de roupa (era às voltas,lembram-se?); O Barco do Amor, que apesar de agora reposto na Sic Radical, não é a mesma coisa. Naquela altura era actual...
E para acabar a lista, a mais clássica de todas as séries, e que marcou mais gente numa só geração: O Verão Azul.
Ora bem, quem não conhece o Verão Azul merece morrer. Quem não chorou com a morte do velho Shanquete, não merece o ar que respira. Quem, meu Deus, não sabe assobiar a música do genérico, não anda cá a fazer nada.
Depois há toda uma série de situações pelas quais estes jovens não passaram, o que os torna fracos:Ele nunca subiu a uma árvore!
E pior, nunca caiu de uma. É um mole.
Ele não viveu a sua infância a sonhar que um dia ia ser duplo de cinema.
Ele não se transformava num super-herói quando brincava com os amigos.
Ele não fazia guerras de cartuchos, com os canudos que roubávamos nas obras e que depois personalizávamos.
Aliás, para ele é inconcebível que se vá a uma obra.
Ele nunca roubou chocolates no Pingo-Doce. O Bate-pé para ele é marcar o ritmo de uma canção.
Confesso, senti-me velho...
Esta juventude de hoje está a crescer à frente de um computador.
Tudo bem, por mim estão na boa, mas é que se houver uma situação de perigo real, em que tenham de fugir de algum sítio ou de alguma catástrofe, eles vão ficar à toa, à procura do comando da Playstation e a gritar pela Lara Croft.
Óbvio, nunca caíram quando eram mais novos. Nunca fizeram feridas, nunca andaram a fazer corridas de bicicleta uns contra os outros.
Hoje, se um miúdo cai, está pelo menos dois dias no hospital, a levar pontos e fazer exames a possíveis infecções, e depois está dois meses em casa fazer tratamento a uma doença que lhe descobriram por ter caído.
Doenças com nomes tipo 'Moleculum infanticus', que não existiam antigamente.
No meu tempo, se um gajo dava um malho muitas vezes chamado de 'terno' nem via se havia sangue, e se houvesse, não era nada que um bocado de terra espalhada por cima não estancasse.
Eu hoje já nem vejo as mães virem à rua buscar os putos pelas orelhas, porque eles estavam a jogar à bola com os ténis novos.
Um gajo na altura aprendia a viver com o perigo.
Havia uma hipótese real de se entrar na droga, de se engravidar uma miúda com 14 anos, de apanharmos tétano num prego enferrujado, de se ser raptado quando se apanhava boleia para ir para a praia.
E sabíamos viver com isso. Não estamos cá? Não somos até a geração que possivelmente atinge objectivos maiores com menos idade?
E ainda nos chamavam geração 'rasca'... Nós éramos mais a geração 'à rasca', isso sim. Sempre à rasca de dinheiro,sempre à rasca para passar de ano, sempre à rasca para entrar na universidade, sempre à rasca para tirar a carta, para o pai emprestar o carro. Agora não falta nada aos putos.
Eu, para ter um mísero Spectrum 48K, tive que pedir à família toda para se juntar e para servir de presente de anos e Natal, tudo junto.
Hoje, ele é Playstation, PC, telemóvel, portátil, Gameboy, tudo.
Claro, pede-se a um chavalo de 14 anos para dar uma volta de bicicleta e ele pergunta onde é que se mete a moeda, ou quantos bytes de RAM tem aquela versão da bicicleta.
Com tanta protecção que se quis dar à juventude de hoje, só se conseguiu que 8 em cada dez putos sejam cromos.
Antes, só havia um cromo por turma. Era o totó de óculos, que levava porrada de todos, que não podia jogar à bola e que não tinha namoradas.
É certo que depois veio a ser líder de algum partido, ou gerente de alguma empresa de computadores, mas não curtiu nada.'
(Nota: ...os chocolates não eram gamados no 'Pingo Doce'... Ainda se chamava 'Pão de Açúcar'!!!)

segunda-feira, 15 de março de 2010

A viúva junto ao rio. -conto de José Luís Peixoto-

É com prazer que vou constatando que as aulas de escrita criativa servem para despertar, quem gosta da arte de juntar palavras. As aulas não fazem escritores, mas ensinam formas de dotar os textos de uma energia que prende o leitor. O tom, o ritmo, a intenção. Lembro-me particularmente de uma aula na "Companhia do Eu", em que se falou de como a repetição de palavras pode muscular um texto, dando-lhe força.

As semanas passaram, fizeram os anos. As semanas são agora os anos.Os companheiros de escrita, homens e mulheres. Os professores, homens e mulheres. Os companheiros e professores, homens e mulheres.
As semanas passaram, fizeram os anos.
Os homens e mulheres, agora amigos.

Por isso, para todos os que me acompanham na Escola de Escrita Criativa, "Companhia do Eu", aqui fica um exemplo do que aprendemos nesse lugar de encontrar sonhos.
Um conto de José Luís Peixoto, "A viúva junto ao rio", que pertence ao livro "Cal", em que a repetição de palavras dá força ao texto.


Alberto Pereira

quarta-feira, 10 de março de 2010

I PRÉMIO DE POESIA O BACALHAU - PARA MAIS TARDE RECORDAR



Há noites assim, que de tão simples, são eternidade.

terça-feira, 9 de março de 2010

Mulheres Algemadas



O poema "Mulheres Algemadas" de Alberto Pereira, dedicado ao percurso doloroso que estas tiveram de trilhar ao longo dos séculos, está disponivel no Biblioblogue, blogue da biblioteca da Escola Secundária 3EB3, Dr. Jorge Augusto Correia -Tavira.
Este poema foi o vencedor do Concurso de Poesia (tema livre)
da ACAT em Dez. 2009.

http://estbiblioblogue.blogspot.com/2010/03/8-de-marco-dia-da-mulher.html

segunda-feira, 8 de março de 2010

DIA DA MULHER - "MULHERES ALGEMADAS"


Dia Internacional da Mulher.

Aqui fica uma homenagem a todas as mulheres,
lembrando no entanto, que estas não devem existir como
um calendário onde podemos assinalar o dia em que
os seus corpos podem ser felizes.

Um texto que atravessa os séculos, que fala das feridas que foram,
até a sua revolta construir um lugar de viver.

O poema "Mulheres Algemadas", de Alberto Pereira,
foi vencedor do Concurso de Poesia(tema livre),
da ACAT em 2009

Endereço onde pode se pode ouvir o poema, dito por Zélia Santos.

https://mail.google.com/mail/?hl=pt-PT&shva01#inox/1273bbaba12b236a


MULHERES ALGEMADAS


Ao princípio eram ilhas, silenciosas,
espancadas pelos afazeres quotidianos,
submersas nesse continente masculino bronzeado de ordens.
Depois, devagar,
à medida que a vegetação dos seus corpos foi secando,
revoltaram-se com a ausência de luz.
Com delicadeza ergueram suavemente a voz.
O mundo musculado dos que davam ordens inquietou-se.
Tentaram convencê-las que a sua tarefa era cuidar dos filhos,
espancaram-nas, amordaçaram a clorofila que lhes dançava nas veias.
Chamaram-lhes loucas,
arranjaram até atestados para comprovar tal insanidade.
Vedaram às suas águas a literacia, a educação, a cultura.
Dos séculos herdaram a insularidade obediente da tradição,
a gestação descontrolada,
o cárcere doméstico de quatro paredes
rabiscando sem cessar a veloz extinção do pó.
Enganaram a rotina com metáforas que bebiam
nos brinquedos espalhados pelos filhos.
Quando sonharam ter árvores
no pedaço de terra dos seus corpos,
deceparam-lhes os poemas dos ramos,
meteram-lhes grades nas mãos,
porque o trabalho traz independência,
aniquila a submissão.


Tiveram como legado
a biografia desflorestada dos desejos,
a repressão da sensualidade,
a ancoragem no medo.
A tempestade era o único beijo que conheciam
porque os homens
lhe canonizaram o Inverno na alma.
Mas uma ilha sensível sabe esperar,
avança lentamente por entre os espartilhos da liberdade.
Um dia cansadas juntaram-se,
floriu um arquipélago.
De arco-íris em punho,
assoaram a delicadeza ao sangue
e rumaram ao proibido.
Com o fôlego exausto de cativeiro,
incendiaram a voz
porque o tempo sempre foram homens embarcados no céu.
Romperam o exílio do próprio brilho,
afogaram o preconceito
e de têmpera a têmpera açaimaram as nuvens
porque não queriam mais ouvir a neve ladrar.

Hoje, gritam ao abismo imposto,
arregalam os olhos à sombra
e a claridade que sempre tiveram nas cabeças
começa a alumiar o mesmo diâmetro que o sexo oposto.

Mas não se iludam,
o velho continente ainda usa máscara.

Alberto Pereira

sábado, 6 de março de 2010

I PRÉMIO DE POESIA "O BACALHAU"



Decorreu ontem à noite no Mar Adentro Café, o lançamento do 7º número da Revista Callema. Num ambiente descontraído, juntaram-se pessoas que gostam da arte de escrever. Que o fazem, não por lucro, mas porque literatura lhes continua a escrever os corpos.
Foram também revelados os premiados do I Concurso de Poesia "O Bacalhau".

1º Prémio - "Firmamento", de Ana Isabel Rodrigues Jerónimo

Menção Honrosa

"a praia e o depois e depois", de Paulo Serra

"Guernica", de Alberto Pereira


Júri

Rui Almeida (Poeta)
Ilídio J.B. Vasco (Representante da Cooperativa Literária)
Rebeca Hernández (Docente da Universidad de Salamanca, tradutora e ensaísta)

I PRÉMIO DE POESIA "O BACALHAU"

quinta-feira, 4 de março de 2010

I PRÉMIO DE POESIA O BACALHAU ENTREGA DE PRÉMIOS



Dia 5 de Março, no Mar Adentro Café, na Rua do Alecrim 35, Lisboa, será feita a entrega do I Prémio de Poesia "O Bacalhau". Será também apresentado o Nº 7 da Revista Callema onde são publicados os 3 poemas premiados.
Basta aparecer.